segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Poeira no violão (poesia)


Olho pro canto empoeirado do meu quarto e vejo o violão parado.
Fazem uns seis meses.
Não consigo tirar alma daquele monte de madeira morta.
No máximo faço uns plic, plic, plics quando bato nas cordas.
Prefiro o som retumbante de uma lágrima espoucando no chão
ao esganiçar do boçal si bemol com sexta que tento reproduzir naquela bossinha safada.


Daí vi que tinham duas baratinhas a morar na caixa do bendito violão.
    - pra vocês verem o quanto eu o uso -

Decidi fazer um favor para a zoologia e outro para a humanidade: não matarei as baratinhas. E não mais tentarei tocar um bourrée sequer.
Vamos fazer assim: deixar o violão para quem sabe dele.


As baratinhas suspiraram um “ufa”.


sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Clichê (poesia)



Em literatura e na poesia, principalmente, o clichê funciona como um terápico do mal

Quebranto que se usa para destroçar a rima safada (que para leigos é algo de belo) em poeirinha

Se você vir a ler algo parecido com “a vida diante dos olhos” etc.

Saiba que isto não é novidade alguma

E talvez remonte dos tempos imemoriais dos Árcades

Mas o destino, muito filho da puta, prega peças

E um dia eu tava abrigado da torrente que submerge Manaus

Tava até confortável se me rindo dos pedestres incautos que se aventuravam debaixo do toró

Quilos de guarda-chuvas desfilavam para cá e lá entrecobrindo o rosto dos que os empunhava

Quando por alguns segundos tive bela visão morena

Esguia, mas com uma postura e andares majestosos, caminhava plácida

Poderia acabar aqui essa poesia, mas a alma não deixa

A alma burra não enxerga o clichê:

Tesões senti por cada fio de cabelo molhado da chuva

Que no rosto dela pendiam

1.500.000 tesões

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Happy Birthday (poesia)


O bolo de aniversário foi comprado por ela mesma
Numa padaria
E a atendente tinha que abanar o bolo com as mãos
Para evitar as varejeiras verdes


Tudo ali ressoava imundície
Eu inclusive
Contudo ela pouco de importava
Hoje ela comemorará 16 anos
E, serelepe, foi buscar a encomenda rósea
Uma massa de farinha de trigo com glacê e chantilly vagabundo
A enfeitar a parte de fora


E o nome dela escrito - de maneira errada - com calda de caramelo
E a coitada se empertigava para soletrar seu nome corretamente
K-A-T-R-Y-E-L-L-E-N-H-Y
E o padeiro fez pouco caso e assim falou:
“um Y a mais, um H a menos... vai-te embora que do jeito que escrevi tá bom”
Eu espiei a combinação randômica do nome e garanto
Que aquilo estava um estrago total - pior que o original


Findado o embróglio do nome da menina, ela pagou o bolo
- com desconto de dois reais pelo erro do confeiteiro -
E saiu da padaria com uma empáfia boníssima
Orgulhossísima por estar comorando aniversário
E mostrando à sociedade, com o bolo rosa em punho, que hoje era o dia dela


Mas infortúnios acontecem e a calçada da padaria estava sendo lavada com sabão
E Katryellenhy estabacou-se
E antes que ela se desse conta da queda
Uma súcia de vagabundos e uma matilha de vira-latas
Estavam a dividir o que sobrara do bolo espatifado no chão

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Cheap wine (poesia)


Verta o copo com vinho barato em mim.
Lamba-me.
Sugue-me o vinho que pelo meu peito desce
Misturado com meu suor, escorrendo por entre as tramas dos meus pelos.



Amanhece e o quarto rescende a sexo e a bebida.
Eu acordo com o rosto perto de uma mancha de porra que no colchão está impregnada.
E abro um sorriso quando vejo você (sem nem me importar com o sêmen ressequido).



Dos Malbec que bebi e que vomitei, dos Shyraz que sorvi e deliciei
Do vagabundo vinho que derramastes em mim só o cheiro enjoativo restou no lençol.
Tudo é uva e sexo e vísceras e sangue.
Tudo é algo que almejo e não consigo.
Eu quero a uva, o sexo, a víscera, o sangue e você.



Você é meu infinito desejo de ter.
Ter-te.
Você. Ter. Ter você, apesar do que tu me fazes:
Você exaure todas as minhas energias por cada um dos meus poros.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Quintessências (poesia)


A quintessência do sexo é o gozo
(1)
A quintessência da semana árdua é a segunda-feira enfadonha
(2)
A quintessência do amor
é ouvir o barulho da mijada de quem você gosta
espoucando-se na água residual da privada
e você nem se importar com o fato
(3)

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Boa Noite (poesia)


D-Aletrina para os carapanãs
E, é claro, para mim
A fumacinha que da espiral sai e contagia todo o ambiente
Faz-me lembrar dos tempos imemoriais
Em que se podia fumar gostosamente em locais fechados


Numa noite insone eu observei a queima completa
De um Sentinela®
E vos digo que isso é O verdadeiro exercício de paciência
A combustão é lenta demais
A fumaça não produz denso fogg
E a porra dos mosquitos ficam fazendo pouco caso
Da piretrina que empesteia seu lençol com um mau cheiro
Mas não manda os Aedes aegypti para a puta que os pariu


Por mais “inodora” que seja a fórmula anunciada pelo fabricante
Preferi as espirais verdes para combater as muriçocas do meu quitenete
Por dois motivos: 
1) lembrança da minha infância 
2) analogia com nossa vida: nós vivemos nos queimando para dar um alento para os outros e no final das contas acabamos arriados no chão como pó e cinzas